sexta-feira, 31 de outubro de 2025

OS CUSTOS OCULTOS QUE A ETIQUETA DOS VINHOS NÃO TE CONTA

Que o futuro do setor agroalimentar deve ser mais sustentável é agora um dado adquirido. Mas quanto custa realmente a comida que levamos para a mesa? Não o preço na etiqueta, mas o seu custo real para a coletividade. A resposta vem do Índice de Impacto Socioambiental das Cadeias Agroalimentares (ISFA), desenvolvido pela Up2You e apresentado durante Food Social Impact 2025. Os resultados são surpreendentes: o iogurte ao quilo não custa 4 euros, mas 6,61 euros, ou seja, 65% a mais. Uma diferença causada por despesas com saúde, degradação do solo e perda de biodiversidade. Mesmo produtos de excelência do Made in Italy, como o molho de tomate (+51%) e a massa (+42%), escondem custos significativos, relacionados principalmente ao consumo de água e às emissões.

Essa abordagem, baseada na Contabilidade do Custo Real, monetiza os impactos ambientais e sociais, revelando o “preço real” dos produtos. Se este é o quadro para alguns dos produtos mais comuns, como se aplica este mesmo conceito ao complexo mundo do vinho?

Se cadeias produtivas como a de “carne e charcutaria” são consideradas as mais impactantes a nível ambiental e social, também o setor vitivinícola é chamado a uma profunda reflexão. A sustentabilidade neste âmbito vai muito além da certificação biológica no rótulo e toca três pilares fundamentais: ambiente, ética e inovação. 

A pesquisa destaca que o consumo de energia (53%) e água (42%) são os principais fatores ambientais excluídos dos preços reais. Esse dado é um sinal de alerta para a viticultura. A videira, apesar de ser uma cultura resiliente, requer grandes quantidades de água, estimadas entre 300 e 600 litros por metro quadrado em climas temperados. Num contexto de alterações climáticas, a pegada hídrica de uma vinha torna-se um indicador que não pode ser ignorado. A isso se soma a pegada de carbono (Carbon Footprint), que calcula as emissões de gases de efeito estufa ao longo de todo o ciclo de vida do vinho. Desde o trabalho no campo até a energia utilizada na adega para a vinificação e, sobretudo, para a embalagem, cada fase tem seu peso.

Para responder a essa necessidade, na Itália foram desenvolvidos padrões de certificação específicos, como o V.I.V.A. do Ministério do Meio Ambiente e o Equalitas, promovido pela Federdoc e pela Unione Italiana Vini. Esses protocolos não se limitam à análise do solo, mas medem indicadores objetivos, como a pegada de carbono e hídrica, incentivando as empresas a fazerem uma autoavaliação e a melhorarem continuamente seu desempenho. Uma abordagem que considera a vinha um agrossistema complexo, onde a saúde do solo e a proteção da biodiversidade, favorecidas também pelo precioso trabalho das abelhas, se tornam um elemento chave para a resiliência e a qualidade do produto final.

A análise do Grupo Food analisa ainda o fator humano: os custos sociais ocultos mais significativos são as condições de trabalho precárias ou de exploração (62%) e a baixa rentabilidade para os produtores agrícolas (53%). Também neste caso, o vinho não está imune. O setor agrícola italiano, incluindo a viticultura, enfrenta há anos o drama do caporalato e do trabalho irregular, que, de acordo com o VII Relatório Agromafias e Caporalato, envolve mais de 200.000 pessoas. Garantir contratos justos, segurança e dignidade aos trabalhadores sazonais é o primeiro passo para uma sustentabilidade que seja realmente tal.

Igualmente crítica é a questão da remuneração justa dos viticultores. A pressão da grande distribuição e as dinâmicas do mercado muitas vezes comprimem as margens dos produtores, colocando em risco a sobrevivência das pequenas empresas agrícolas que representam o coração pulsante de nossos territórios vinícolas. A “verdadeira qualidade”, como destaca a pesquisa, é construída no começo da cadeia produtiva, na produção agrícola, e isso não pode prescindir de uma economia saudável e justa para quem cultiva a terra.

A transição para modelos sustentáveis requer investimentos e inovação. Duas áreas em que o vinho está dando passos gigantescos são a embalagem e a energia. Embora a garrafa de vidro continue sendo o ícone do vinho, seu peso representa uma parte significativa de sua pegada de carbono. Por isso, iniciativas como a “Call to Action” da Slow Wine Fair incentivam a adoção de garrafas mais leves, reduzindo o consumo de matérias-primas e as emissões no transporte. Além do vidro, materiais alternativos como PET reciclado, alumínio (latas) ou bag-in-box estão sendo explorados com interesse, pois oferecem vantagens em termos de peso e impacto logístico.

Paralelamente, a transição energética já é uma realidade em muitas vinícolas. Fabio Tentori, CEO da Geoside, lembrou que um sistema fotovoltaico bem dimensionado pode cobrir de 30% a 70% das necessidades energéticas de uma empresa. Não faltam exemplos virtuosos na Itália: desde vinícolas que utilizam caldeiras a biomassa ou a condensação até aquelas que exploram a geotermia para a climatização natural dos ambientes, demonstrando que a eficiência energética e a sustentabilidade não são um custo, mas uma vantagem competitiva concreta.

A pesquisa da Food Social Impact nos leva a questionar o que está por trás de um rótulo e quais são os reais custos – ambientais e sociais – que se escondem por trás das garrafas de vinho. Saber a resposta permite que a cadeia produtiva aja com consciência para se tornar um modelo de desenvolvimento mais equitativo, tanto no aspecto ambiental quanto econômico e social.

Nenhum comentário:

Postar um comentário